segunda-feira, 27 de agosto de 2007

ASSIM

Trinco os dentes,
engulo o sal,
arranho a carne,
vomito a dor,
sorrio o grito,
sufoco o fim...
enquanto sangro.

sexta-feira, 24 de agosto de 2007

LASCÍVIA

Me entrego -
boca, língua e gestos -
enquanto liquefazes
a noite em mim.

quarta-feira, 22 de agosto de 2007

ESPECTROS

Vozes esmaecidas sussurram na varanda opaca,
dizendo dos quintais onde me perdi antigamente...
Lembranças de tias e de dores,
lumeeiros, catacumba, assombração...

Ter vivido aqueles dias mornos -
limonada na janela, vislumbres,
ventanias e ciprestes -
me reduzem ao que sou:
errante e vã, perdida em tempo estranho.

terça-feira, 21 de agosto de 2007

ELA

uma mulher densa, quase tensa.
uma mulher quase.
quase doce,

quase isenta,
quase ela.
possuidora de agudezas precipitadas,
mais do que comportam seus parcos metro e pouco.
culta, calma e calada,

quando não provocada.
capaz de fúrias insensatas e perdões absolutos.
uma observadora distraída,
do seu tempo, atemporal.
qualquer idade lhe cabe.
solitária. voraz. preguiçosa.
sem grandes pudores, ou grandes penas.

nem grandes temas.
uma mulher quase
quase linda,
quase tímida.
quase terna.

tonta.

quinta-feira, 16 de agosto de 2007

DE MEU

tenho alguns livros e um cachorro antigo
faço pães e desfaço letras
bordo laços,
teço tramas,
tramo enganos.

tenho alguns quadros e um caderno fino
cultivo angústias ao entardecer,
guardo acasos, pesadelos
e uns poucos sonhos
que não me deixam dormir...

sexta-feira, 10 de agosto de 2007

PARA QUE LEIAS

Calo minha boca
no teu corpo
enquanto pulsas.
Febre e voragem
sons e vertigem.

segunda-feira, 6 de agosto de 2007

PARA QUE CONSTE

Quero uma vida falsa.
dores sem cores, estertores,
palavras confusas, lampejos,
arranhões, desilusões,
perigos, tempestades,
angústias sombrias, crueldades,
opressão. vinho e veneno,
aspereza, ambigüidade,
remorsos silentes, insônias,
estratagemas, assombros
constrangimentos,
faca, sangue, sentimento.
Quero uma vida inaudita,
eu, a que já não sou.